quinta-feira, 29 de março de 2018

Gravador: Augusto Fernando Gerard (1796-1883)


Augusto Fernando Gerard (1796-1883), um dos melhores e mais prolíferos artistas não só de condecorações militares (Medalha de D. Maria II, Expedição a Angola e duas variantes da Medalha Militar), mas também de medalhas de mesa, notas, selos, etc. Aqui ficam alguns exemplos da sua arte:


MEDALHA MILITAR
Na esquerda, os dois modelos assinados AFG.



MEDALHA DE ANGOLA 1860




* * *

A revista Occidente publicou o seguinte texto, por ocasião da sua morte em 1883:

“O exímio artista, de que damos o retrato a página 144, nasceu em Paris em agosto de 1796, na freguesia de Santo Eustáquio, mas quase se pode considerar português, porque veio para Portugal na idade de 18 anos, e aqui viveu até aos 86 anos, falecendo no dia 29 de maio ultimo [1883], em sua casa na rua Nova do desterro, 40, 1.º, pelas 3 horas da tarde.
Aos 18 anos de idade, Gerard não seria um artista consumado, entretanto tinha cursado a escola de Belas Artes de Paris, onde fora premiado e estava ao facto dos processos práticos da sua arte, quando veio para Portugal contratado para a oficina de ourivesaria de Santos Leite, em Braço de Prata.
Foi nos trabalhos de esmalte, em que principalmente começou a revelar a sua aptidão e conhecimentos artísticos. Era o esmalte por essa época (1820) feito a buril, Gerard operou a sua completa transformação, introduzindo o sistema de cunho, o que teve grande alcance económico.
Logo que terminou a escritura que tinha feito com a dita casa, foi Gerard convidado para os trabalhos do Banco de Lisboa, e depois de Portugal, do qual foi, durante muitos anos, gravador efetivo, e para o qual depois trabalhou nos períodos convenientes.
Quando o seu belo trabalho das notas gravadas em cobre entrou no domínio do público causou geral admiração, e Gerard foi desde logo notado entre os artistas de maior renome.
Pouco depois o Banco do Porto convidava Gerard a ir aquela cidade, fazer trabalho semelhante com relação às suas notas, e não obstante a perfeição da execução dele e os incómodos maiores da jornada, por não existir ainda caminho de ferro, foi considerada tão modesta a conta que Gerard apresentou da importância do seu trabalho (400$000 reis) que a direção do Banco julgou deve-la dobrar, gratificando o exímio artista com 800$000 reis.
Nunca mais lhe faltou trabalho, e a carreira do artista acha-se assinalada em todos esses cunhos de carácter mais ou menos oficial.
Todas as chapas necessárias para a Junta do Crédito Público, gravadas em cobre, selos em relevo para várias dignidades eclesiásticas e secretárias.
A direção da casa da moeda convidou-o por vezes para coadjuvar os trabalhos de gravura, apresentando belos modelos de estampilhas.
São do seu buril as medalhas da inauguração do caminho de ferro de Leste, que reproduzimos hoje em gravura, das Academias de Belas Artes de Lisboa e Porto, de D. Maria II ao mérito, da Associação dos Melhoramentos das Classes Laboriosas, da Exposição Internacional do Porto, para premiar os expositores, da Real Associação Naval, da Exposição Agrícola do Porto e outras de grande merecimento artístico.
Era académico de mérito da Academia de Belas Artes de Lisboa, e fora premiado com a medalha de prata da Exposição do Porto.
Seria longo especializar os trabalhos de Gerard, e foram precisas muitas pesquisas, que a escassez de tempo não permite, para agrupar todos os gravados saídos do seu buril.
Causará decerto assombro saber que dois meses antes do seu falecimento ainda gravava tanto em cunho, como em cobre, e são suas últimas obras, a medalha que, muito instado, fez para a Sociedade Promotora do Apuramento das Raças Cavalares, e uma chapa de cobre para bilhetes de visita do sr. Serzedelo Júnior. Estes trabalhos desempenhados com precisão, nitidez e segurança na avançada idade de 86 anos eram e são admirados dos próprios artistas.
Decano dos gravadores em metal, o eminente artista era para todos os novos artistas, um guia seguro, um mestre benigno, um pai cuidadoso. Quem precisasse do seu ensino, do seu conselho, recorrendo a ele, estava seguro de o encontrar são, benevolente e prestadio; ele explicava-lhe os segredos da arte, ele retocava-lhe os seus trabalhos, pródigo sempre do seu saber, do seu génio artístico.
Era um perfeito cavalheiro, e como artista para os seus irmãos, ou melhor para seus filhos e discípulos na arte desmentia o nosso provérbio que diz que «o teu maior inimigo é o oficial do teu ofício.»
Mas Gerard, nem exercia ofício, nem era um artífice, era artista, e exercia nobremente a sua arte.
Os artistas choram-no todos e este é o seu melhor brasão.”


in: Occidente: Revista Ilustrada de Portugal e do estrangeiro, n.º 162, Volume VI, 21 de Junho de 1883 [Transcrição com modernização ortográfica.]

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